Por G1


Em março de 2019, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, abriu inquérito criminal para investigar "notícias fraudulentas", ofensas e ameaças que "atingem a honorabilidade e a segurança" da Corte, de seus membros e de familiares. A investigação ficou conhecida como "inquérito das fake news". O ministro Alexandre de Moraes foi nomeado relator do caso.

Em meio a questionamentos sobre a abertura do inquérito, com críticas que partiram inclusive da então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e de membros do próprio STF, as investigações já duram mais de um ano. Em 18 de junho, o STF decidiu, por 10 votos a 1, em favor da legalidade da legalidade do inquérito, que deve prosseguir (leia detalhes abaixo).

Este inquérito é diferente do que investiga atos antidemocráticos, mas há pessoas, como a extremista Sara Giromini, que são investigadas em ambos.

Em 27 de maio, a Polícia Federal (PF) cumpriu 29 mandados de busca e apreensão como parte do inquérito das fake news. Entre os alvos, aliados do presidente Jair Bolsonaro, como o ex-deputado federal Roberto Jefferson; o empresário Luciano Hang, dono da Havan; os blogueiros Allan dos Santos e Winston Lima e a extremista Sara Giromini.

Horas após a operação ter sido deflagrada, o atual PGR, Augusto Aras, pediu ao STF a suspensão do inquérito das fake news. Em outubro do ano passado, no entanto, ele havia afirmado que não havia ilegalidade na investigação.

Bolsonaro se manifestou publicamente sobre a operação um dia depois de ela ter sido deflagrada. "Ordens absurdas não se cumprem" disse.

Veja, abaixo, perguntas e respostas sobre a investigação:

  1. Quando o inquérito foi aberto e qual era o objetivo?
  2. Por que, em vez de sortear, Toffoli nomeou o relator do caso?
  3. Por que a abertura do inquérito foi questionada?
  4. O que a investigação já concluiu?
  5. Qual a relação do inquérito com a censura à revista 'Crusoé' e ao site 'O Antagonista'
  6. Que mandados já haviam sido cumpridos antes?
  7. Quem foi alvo de mandados em 27 de maio?
  8. Quem são os deputados que o STF exigiu que fossem ouvidos?
  9. As mudanças na PF, que motivaram a saída de Sergio Moro, interferem na investigação do STF?
  10. Como Bolsonaro reagiu à operação que tinha apoiadores dele como alvo?
  11. O que Augusto Aras disse sobre o inquérito?
  12. O que o STF decidiram sobre a legalidade do inquérito?
  13. Por que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, foi incluído no inquérito?
  14. Investigados podem acessar o inquérito?

Quando o inquérito foi aberto e qual era o objetivo?


O inquérito foi aberto em 14 de março de 2019. Inicialmente, o prazo das investigações ia até janeiro de 2020. Em dezembro de 2019, contudo, o ministro do STF Alexandre de Moraes prorrogou as investigações por mais seis meses.

Ao instaurar a investigação, o presidente do STF, Dias Toffoli, falou em apurar "notícias fraudulentas", ofensas e ameaças que "atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares".

Não foi delimitado, no entanto, um objeto específico ou grupo a ser investigado, apenas as possíveis infrações.

Por que, em vez de sortear, Toffoli nomeou o relator do caso?


O STF diz que o regimento da Corte permite a abertura de investigações para apurar crimes cometidos dentro da instituição e considera que, nesse caso, é permitida a designação de juiz para conduzir a apuração, sem que haja sorteio. Os ministros são considerados pelo STF à própria instituição, em qualquer lugar em que estejam.

Por que a abertura do inquérito foi questionada?

A abertura de inquérito "de ofício" – sem ser provocado por instituições como a PF ou o Ministério Público – e a designação de um relator sem que houvesse sorteio geraram críticas no MPF e no meio jurídico. Dez ações foram apresentadas ao STF questionando a investigação.

Outro ponto questionado é o fato de que os suspeitos não têm foro no STF, mas, sim, as vítimas – neste caso, os próprios ministros da Corte.

O Supremo, por sua vez, sustenta o inquérito com o argumento de que o regimento da Corte permite a abertura de investigações para apurar crimes cometidos dentro da instituição.

Um dos magistrados mais antigos do STF, o ministro Marco Aurélio Mello foi uma das vozes críticas à decisão de Toffoli. Marco Aurélio disse que o Supremo deveria "manter uma necessária distância de investigações que envolvam apuração de suposto crime contra a própria Corte".

O que a investigação já concluiu?

Em março de 2020, técnicos do STF identificaram 12 perfis em redes sociais – nomes não foram divulgados – que atuam na disseminação de informações de forma padronizada contra ministros do tribunal.

Isso significa, por exemplo, que esses perfis encaminham o mesmo tipo de mensagem, da mesma forma, na mesma periodicidade. Agora, os técnicos cruzam informações para tentar localizar financiadores desses perfis.

A TV Globo apurou na época que, dentre os suspeitos de financiar as ofensas, há apoiadores do presidente, além de outros empresários.

Qual a relação do inquérito com a censura à revista 'Crusoé' e ao site 'O Antagonista'

No dia 15 de abril de 2019, Moraes determinou que a revista "Crusoé" e o site "O Antagonista" retirassem do ar reportagens e notas que citavam o presidente da Corte, Dias Toffoli. Moraes estipulou multa diária de R$ 100 mil e mandou a Polícia Federal ouvir os responsáveis pela revista e pelo site e em até 72 horas. "Crusoé" e "O Antagonista" recorreram.

Dias depois, após críticas públicas de juristas, procuradores e até de ministros do STF, que se manifestaram contra a censura, Moraes revogou a decisão.

Que mandados já haviam sido cumpridos antes?

No dia 21 de março de 2019, uma semana após a abertura das investigações, foram cumpridos os primeiros mandados de busca e apreensão – em São Paulo e Alagoas.

Um dos alvos da busca, o advogado Adriano Laurentino de Argolo afirmou não ser o autor de algumas das mensagens que lhe foram atribuídas. Ele também disse que teve contas em redes sociais clonadas.

No dia 16 de abril de 2019, a PF cumpriu oito mandados de busca e apreensão – em São Paulo, Goiás e Distrito Federal. No despacho que determinou a ações, Moraes afirmou que foi verificada "a postagem reiterada em redes sociais de mensagens contendo graves ofensas a esta Corte e seus integrantes, com conteúdos de ódio e de subversão da ordem".

A operação mirou sete pessoas, que foram alvos dos mandados de busca e apreensão. Entre nomes estava o do general da reserva Paulo Chagas, candidato derrotado do PSL ao governo do Distrito Federal na eleição de 2018.

Em 27 de setembro de 2019, a PF cumpriu mandados na casa e no escritório de advocacia do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. No apartamento dele, a PF apreendeu arma e munição.

Os mandados de busca e apreensão foram emitidos um dia após Janot afirmar em entrevista que, em 2017, quando ainda estava no cargo de PGR, entrou armado no STF com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes e depois se suicidar.

Quem foi alvo de mandados em 27 de maio?

  • Luciano Hang (SC): empresário, dono da Havan, apoiou Bolsonaro durante a eleição de 2018 e segue aliado do presidente.
  • Roberto Jefferson (RJ): ex-deputado federal preso no Mensalão. Seu partido, o PTB, declarou apoio a Bolsonaro em 2018. Nas redes, tem defendido o presidente e criticado o STF, pedindo que Bolsonaro aposente compulsoriamente os ministros.
  • Allan dos Santos (DF): blogueiro, é apoiador de Bolsonaro e um dos fundadores do site Terça Livre.
  • Sara Giromini: blogueira. Em uma rede social, se define como "ativista pró-vida e pró-família, analista política e conferencista internacional". Além de ter sido alvo de mandado de busca e apreensão em 27 de maio, ela foi presa em 15 de junho como parte do inquérito dos atos antidemocráticos. Sara chefiou o acampamento em Brasília do grupo 300 do Brasil, que foi apontado pelo Ministério Público Federal como uma "milícia armada". Ela também foi denunciada pelo MPF por injúria e ameaça contra o ministro Alexandre de Moraes.
  • Winston Lima (DF): blogueiro, dono do canal no YouTube "Cafezinho com Pimenta", onde transmite diariamente as falas de Bolsonaro na saída do Palácio do Alvorada. Promove manifestações de apoio ao presidente.
  • Edgard Corona (SP): empresário, dono das redes de academia SmartFit e BioRitmo.
  • Edson Pires Salomão (SP): assessor parlamentar do deputado estadual Douglas Garcia (PSL-SP).
  • Enzo Leonardo Suzi (SP): youtuber no canal no YouTube "Enzuh" e apoiador do governo Bolsonaro.
  • Marcos Bellizia (SP): um dos líderes do movimento Nas Ruas, que foi fundado em 2011 por Carla Zambelli, hoje deputada federal. O grupo organizava manifestações populares, em geral contra a corrupção.
  • Otavio Fakhoury (SP): investidor do setor imobiliário, um dos fundadores do partido Aliança para o Brasil, que está sendo formado em torno de Bolsonaro, e colaborador do site conservador Crítica Nacional.
  • Rafael Moreno (SP): blogueiro, ativista do Movimento Brasil Monarquista e membro da Confederação Monárquica do Brasil.
  • Rodrigo Barbosa Ribeiro (SP): assessor parlamentar do deputado Douglas Garcia (PSL) e líder do Movimento Conservador em Araraquara (SP).
  • Paulo Gonçalves Bezerra (RJ): empresário.
  • Reynaldo Bianchi Júnior (RJ): humorista, músico e palestrante.
  • Bernardo Kuster (PR): em uma rede social, se define como diretor de opinião do jornal "Brasil Sem Medo". O veículo tem como presidente de seu conselho editorial Olavo de Carvalho, ideólogo do qual Bolsonaro se declarou, em 2019, um admirador.
  • Eduardo Fabris Portella (PR)
  • Marcelo Stachin (MT): nas redes sociais, é defensor de Bolsonaro e com frequência se manifesta contrário ao STF.

Quem são os deputados que o STF exigiu que fossem ouvidos?

O ministro Moraes determinou ainda que deputados fossem ouvidos no inquérito em até dez dias. Eles não foram alvos de mandados em 27 de maio (veja aqui o que eles disseram sobre a determinação). Moraes ordenou que sejam preservadas as postagens dos parlamentares em redes sociais. São eles:

Deputados federais

  • Bia Kicis (PSL-DF)
  • Carla Zambelli (PSL-SP)
  • Daniel Silveira (PSL-RJ)
  • Filipe Barros (PSL-PR)
  • Junio Amaral (PSL-MG)
  • Luiz Phillipe de Orleans e Bragança (PSL-SP)

Deputados estaduais

  • Douglas Garcia (PSL-SP)
  • Gil Diniz (PSL-SP)

As mudanças na PF, que motivaram a saída de Sergio Moro, interferem na investigação do STF?

Em 24 de abril, dois dias depois de Bolsonaro trocar o diretor-geral da PF, Alexandre de Moraes determinou que os delegados responsáveis pelo inquérito fossem mantidos – mesmo com as mudanças na chefia da corporação.

Na prática, a decisão de Moraes tinha o objetivo de blindar as investigações contra interferências.

Como Bolsonaro reagiu à operação que tinha apoiadores dele como alvo?

Bolsonaro se manifestou publicamente sobre a operação nesta quinta-feira (28). "Ordens absurdas não se cumprem. E nós temos que botar um limite nessas questões. Não foi justo o que aconteceu no dia de ontem", afirmou o presidente.

O presidente disse ainda que tem as "armas da democracia nas mãos" e afirmou que não haverá um outro dia igual à quarta-feira.

O que Augusto Aras disse sobre o inquérito?

Aras pediu ao ministro Edson Fachin, do STF, a suspensão do inquérito da fake news. O pedido do atual procurador-geral foi feito em 27 de maio, horas após a operação da PF ter sido deflagrada.

No dia 24 outubro, entretanto, Aras havia afirmado, em parecer enviado ao STF, que não havia ilegalidade no inquérito aberto pela Corte, mas ressaltando que o Ministério Público Federal deveria participar das investigações.

O que o STF decidiu sobre a legalidade do inquérito?

Em julgamento concluído em 18 de junho, o Supremo decidiu, por 10 votos a 1, pelo prosseguimento do inquérito das fake news.

O tribunal analisou uma ação que contestava a legalidade da investigação, apresentada em 2019 pelo partido Rede Sustentabilidade. O partido argumentou que o inquérito tinha sido instaurado sem alvos determinados e que teria como suspeitos “servidores da Receita que investigavam pessoas politicamente expostas e congressistas”.

Mas em 29 de maio – semanas antes de os ministros começarem a julgar a legalidade do caso –, o próprio partido considerou que, diante da escalada das fake news, o inquérito deveria continuar e pediu a extinção da ação. O relator do processo, Edson Fachin, rejeitou o pedido e decidiu remeter o caso ao plenário do Supremo.

No julgamento, os ministros decidiram:

  • se o inquérito tinha validade;
  • até que ponto era exigida a participação do Ministério Público.

O julgamento começou em 10 de junho, e Fachin foi único a apresentar voto naquele primeiro dia – ele votou pela legalidade do inquérito.

A sessão foi retomada em 17 de junho, quando a maioria dos ministros votou pela continuidade do inquérito. No dia seguinte, a votação foi concluída.

Por que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, foi incluído no inquérito?

Em 26 de maio, Moraes determinou, no âmbito do inquérito das fake news, que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, seja ouvido pela PF para explicar falas na reunião ministerial do dia 22 de abril. "Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF", disse na reunião.

O ministro não foi alvo dos mandados de busca e apreensão de 27 de maio. Nesse mesmo dia o ministro da Justiça, André Mendonça, enviou um pedido de habeas corpus ao STF para que o depoimento de Weintraub e as investigações ligadas a ele fossem suspensas.

Em 15 de junho, ao julgar o habeas corpus do ministro André Mendonça, o STF formou maioria contra a retirada de Weintraub do inquérito das fake news. O julgamento, em plenário virtual, deve ser concluído até 19 de junho.

Investigados podem acessar o inquérito?

Pelas decisões do ministro relator divulgadas no dia 2/6, os advogados poderão ter acesso integral às investigações, mas, como o processo tramita em sigilo, as defesas vão precisar agendar acesso no gabinete do ministro. Será fornecida, então, uma cópia digitalizada, com marca d'água, capaz de identificar quem recebeu a mídia.

Moraes permitiu acesso aos advogados de investigados entre os quais o ministro da Educação, Abraham Weintraub; a deputada Carla Zambelli (PSL-SP); Reynaldo Bianchi Júnior, Allan Lopes dos Santos, Bernardo Kuster, Edgard Corona, Luciano Hang, Marcos Domingues Bellizia e Otavio Oscar Fakhoury.

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