Saúde Medicina Vacina

Secretária do Ministério da Saúde aponta necessidade de terceira dose contra Covid-19 em parte da população

Rosana Leite Melo citou decisão tomada pelos EUA para dose extra em pessoas com sistema imunológico comprometido; reforço pode ser implementado no Brasil ainda em 2021
Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde, Rosana Leite de Melo Foto: Divulgação
Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde, Rosana Leite de Melo Foto: Divulgação

BRASÍLIA — A secretária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde, Rosana Leite Melo, indicou nesta segunda-feira que uma parte da população brasileira terá que receber uma terceira dose da vacina contra a doença. Preocupada com o avanço da variante Delta do coronavírus e com o relaxamento das medidas sanitárias pela população, ela citou a decisão tomada na semana passada pelos Estados Unidos recomendando uma dose adicional para pessoas com sistema imunológico comprometido . É o caso de transplantados, alguns pacientes com câncer e portadores do vírus HIV. Rosana disse que os grupos não deverão ser diferentes no Brasil e afirmou que é possível começar esse processo de vacinação já em 2021.

Entenda: Eficácia da primeira dose cai de 50% para 35% diante da variante Delta, mostra estudo

— Se nós formos pensar numa terceira dose, estamos calculando trabalhar priorizando determinados grupos. Só que isso a gente não decidiu ainda, se teremos ou não terceira dose. Existem outras variáveis que são analisadas. Inclusive nossa câmara técnica tem outra reunião esta semana para definir principalmente a parte dos estudos científicos. Mas conseguiríamos fazer (a distribuição da terceira dose) neste ano, sim — disse Rosana.

Alguns pontos ainda precisam ser definidos, como quais imunizantes poderão ter uma terceira dose e se será adotada a intercambialidade, ou seja, a aplicação de uma vacina de fabricante diferente daquela que a pessoa tomou antes.

Entrevista: 'Os gestores precisam ter um plano B para a variante Delta', diz virologista da Fiocruz

Ela disse que o Ministério da Saúde está preocupado com o avanço da variante Delta do coronavírus , identificado pela primeira vez na Índia e que vem se espalhando pelo mundo, levando a um aumento de casos mesmo em locais com muitas pessoas vacinadas. Rosana participa de reunião da Comissão Temporária da Covid-19 que funciona no Senado.

— O que nós sabemos, os dados que nós temos é que, em determinadas faixas etárias, está diminuindo essa proteção (das vacinas) . Temos alguns estudos preliminares, porém esses estudos não foram publicados. São discussões internas, nem podemos publicizar tanto, em respeito aos pesquisadores, porém já estamos tomando as decisões em nível de gestão, o que fazer, o que planejar, quantificar esses grupos que por ventura precisam (de uma terceira dose) , a exemplo do que aconteceu na semana passada nos Estados Unidos, em que se liberou para determinados grupos. Os nossos grupos, provavelmente, pelas nossas discussões, não serão distintos daqueles. Talvez com algumas diferenças — afirmou.

E ainda: Anvisa pede à Pfizer informações sobre estudos de terceira dose de vacina

Segundo a gestora, estudos feitos em Israel, nos Estados Unidos e no Reino Unido mostram que nesses países houve um aumento na taxa de hospitalização, algo que ainda não se observou no Brasil, exceto de forma pontual . Ela  disse que a variante Delta apareceu de forma mais tímida, porém o cenário está mudando. Também criticou o relaxamento de parte da população e de gestores de saúde.

— Houve infelizmente um relaxamento (das medidas sanitárias) não só por parte da população. Entendemos a nossa cultura latina, mas houve um relaxamento mesmo das pessoas mais entendidas em relação a isso.

E também reconheceu falhas na comunicação:

— A comunicação é um dos focos que a gente quer, sim, melhorar.

Estudos ainda 'sem robustez', salienta Dalcolmo

A diretora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Meiruze de Sousa Freitas fez um panorama da aplicação da vacina em outros países. Segundo ela, há debates no Reino Unido, Alemanha e França sobre a terceira dose, com a probabilidade de seguir o caminho de Israel, que já a aplica. No Chile, também há recomendação de uma dose adicional para a população mais velha que tomou a CoronaVac. Nos Estados Unidos, a terceira dose foi autorizada apenas para imunizantes com a tecnologia de RNA mensageiro, caso da Pfizer e da Moderna. A Janssen, que também é aplicada nos Estados Unidos, usa outra tecnologia.

— Notificamos a Pfizer na terça-feira e agendamos reuniões para esta semana para discutir os dados apresentados — disse Meiruze.

Ela afirmou que a Anvisa também vem conversando com agências de outros países. Afirmou ainda que a maioria dos países recomenda doses da mesma vacina, embora em algumas situações específicas seja autorizada a intercambialidade. Meiruze também destacou que, além da discussão da terceira dose, é importante vacinar toda a população com duas doses, o que ainda não foi alcançado.

Margareth Dalcolmo, pesquisadora Fiocruz, destacou que não há estudos com "robustez suficiente" sobre a terceira dose, mas apontou que alguns grupos podem, sim, precisar disso, como idosos que tomaram a CoronaVac, profissionais de saúde e pessoas com deficiências imunológicas. Ela não se mostrou contrária à adoção dessa vacina no Brasil, mas defendeu uma dose adicional para determinados grupos que a tomaram. Ela também criticou o ritmo de vacinação no Brasil.

— Hoje, à luz da presença de novas variantes, como a Delta, cuja possibilidade de se tonar dominante no Brasil é bastante plausível, nós temos situação díspares acontecendo. No Rio de Janeiro, por exemplo, já identificamos a prevalência da variante Delta no monitoramento que fazemos. Já observamos nos últimos dez dias um aumento na demanda de hospitalizações. Tínhamos parado de hospitalizar pacientes idosos, e voltamos a internar. A grande maioria dos hospitalizados foram vacinados, sim, com duas doses da CoronaVac — disse Dalcolmo.

Presidente da comissão, senador Confúcio Moura (MDB-RO) lembrou que o também senador Otto Alencar (PSD-BA) foi contaminado, mesmo tendo tomado duas doses, e citou a morte do ator Tarcísio Meira, que também tinha completado a imunização.

Dalcolmo comentou a morte de Tarcísio:

— Ela reforça mais ainda o pleito que nós trouxemos da absoluta necessidade, e diria mesmo independentemente de aguardar resultado de estudos que ainda podem tomar muito tempo. Não precisamos acumular mais mortes sabendo que a imunossenescêncian (deterioração do sistema imunológico em razão da idade) pode, sim, a partir de uma determinada plataforma, no caso da CoronaVac, exigir de nós uma decisão firme, corajosa de revacinar e proteger essa faixa etária. Acho que esse exemplo é paradigmático nesse aspecto.

A pesquisadora também pediu que as pessoas acreditem na vacinação, e disse que o discurso contra a imunização é criminoso.

A secretária para a Covid-19, Rosana Leite Melo, também falou da morte do ator:

— Pode ter sido por conta não só do imunizante, mas principalmente por ser alguém acima dos 80 anos. Essas observações nos darão subsídios para definir qual é o tempo da terceira dose. Será que utilizaremos com o mesmo intervalo? Será que utilizaremos um tempo maior? Ou será que teremos dose de reforço?

Ela também defendeu a aplicação das vacinas que foram usadas no Brasil.

— Isso é esperado em todas as outras doenças que são preveníveis por imunizante, acontecer no início ter uma vacina, no decorrer algumas são abandonadas porque surgem outras que são melhores. Isso é uma história natural. Mas o mundo não tinha todo esse tempo. O tempo do mundo foi: achamos um imunizante com segurança. A segurança não é 100% — disse Rosana.

Ela também disse que está à vontade no trabalho e que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, lhe deu autonomia. Sua antecessora, Luana Araújo, nem sequer chegou a tomar posse e foi desconvidada por Queiroga. Em audiência na Câmara, o ministro sugeriu que houve um veto do Planalto a ela. Depois, na CPI da Covid do Senado, Queiroga chamou para si a decisão de não ter efetivado Luana.