Caixa Econômica e Banco do Brasil ameaçam deixar Febraban

Bancos criticam posição da entidade sobre manifesto que pede harmonia entre Poderes

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São Paulo e Maringá (PR)

A Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil ameaçam deixar a Febraban, entidade que representa os bancos no país, caso ela oficialize adesão a um manifesto articulado por Paulo Skaf, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

O documento, que ainda está sendo redigido e que deve ser publicado nos próximos dias, mostra preocupação com a escalada da crise entre os Poderes, pede pacificação e defende as reformas.

O possível desembarque foi antecipado pelo jornal O Globo e confirmado pela Folha.

O ministro Paulo Guedes (Economia), o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estão cientes do movimento dos bancos públicos.

Nos últimos dias, Skaf enviou a entidades e sindicatos mensagens pedindo assinaturas ao manifesto. No texto, segundo antecipou o Painel S.A., ele diz que “mais do que nunca, o momento exige aproximação e cooperação entre Legislativo, Executivo e Judiciário e ações para superar a pandemia e consolidar o crescimento econômico e a geração de empregos”.

Segundo pessoas que acompanham a elaboração do documento, nenhum poder é citado especificamente, mas todos, simultaneamente. A Folha apurou que as versões redigidas até o momento não citam o presidente ou qualquer outra autoridade.

Segundo a Folha apurou, no início da semana passada, Caixa e BB comunicaram a decisão de deixar a Febraban, caso ela assinasse o documento. Ainda assim, no fim da semana, a entidade pôs em votação o tema, e a maioria aprovou a adesão. Tão logo o documento seja divulgado, Caixa e BB oficializam a saída da entidade.

Fachada do Banco do Brasil na avenida Paulista, centro de São Paulo - Bruno Santos - 20.nov.2016/Folhapress

Caixa e BB questionam que a Febraban não se posicionou da mesma maneira em outros momentos da história recente, como no caso do impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) ou da Operação Lava Jato.

A avaliação é que, ao aderir a um documento que fala em crise institucional, a entidade estaria abrindo oposição ao governo Bolsonaro e se equiparando a um partido político —o que é qualificado como absurdo na alta gestão dos bancos públicos.

Executivo ligado a uma das instituições falou, na condição de não ter o nome revelado, que também causou descontentamento os trechos do documento que falam da necessidade de fomentar crescimento e emprego, como se o governo Bolsonaro não estivesse entregando resultado na economia.

Esse executivo argumenta que houve expansão do PIB (Produto Interno Bruto) e há aumento de contratações com carteira assinada nos números do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados).

Nas palavras de um integrantes do governo, não é razoável que bancos públicos federais façam oposição ao governo —e seu acionista—, e seria natural que deixassem a Febraban se for oficializado que ela aderiu ao manifesto.

Segundo pessoas do governo que acompanham a discussão, um dos principais articuladores do desembarque é Pedro Guimarães, presidente da Caixa, que tem relacionamento muito próximo a Bolsonaro e seus filhos. Guimarães tem dito para quem acompanha o caso que a Caixa tomou a decisão internamente, sem nenhuma interferência do governo.

No BB fala-se em "constrangimento" em participar de uma entidade que assina um documento com críticas a seu maior acionista, o governo federal.

Indo além da crise envolvendo a Febraban, o governo está incomodado com as manifestações contrárias à gestão Bolsonaro feitas por empresários nas últimas semanas. A avaliação é que o setor empresarial subiu o tom.

Causaram mais descontentamento ainda manifestações críticas feitas por banqueiros e executivos do alto escalão de instituições financeiras, tanto as de caráter reservado quanto –e, principalmente– as que ocorreram de forma pública. Além de assinarem manifestos, alguns daram entrevistas questionando a gestão Bolsonaro.

Causou estranhamento que num manifesto de apoio ao sistema eleitoral –alvo de críticas e ameaças do presidente– constassem nomes importantes do setor financeiro, como Moreira Salles, do Itaú Unibanco. Também não foi bem recebido que executivos dessem entrevistas com críticas, caso de José Olympio Pereira, presidente do Credit Suisse no Brasil.

Em evento realizado na XP na última semana, outras referências do setor financeiro também demonstraram insatisfação com o presidente da República e sua gestão. O presidente do Verde Asset Management, Luis Stuhlberger, chamou Bolsonaro de “fraco” e “refém do centrão” ao comentar a dificuldade em se aprovar a Reforma Tributária.

Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro e diretor da ASA Investments, disse que o que está sendo feito de errado agora na economia servirá para contratar um “pibinho” no ano que vem.

Na avaliação do governo, Skaf articula o manifesto por ter sido preterido politicamente. Ele buscou apoio de Bolsonaro para se lançar ao governo paulista na eleição de 2022, mas o presidente tem sinalizado que vai optar pela candidatura do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas.

Nesse contexto, a adesão da Febraban ao documento da Fiesp seria uma espécie de gota d'água.

A mobilização de Skaf ocorre no momento em que Bolsonaro trava sucessivos embates políticos, especialmente contra o Judiciário, e enquanto seus apoiadores organizam uma grande mobilização a favor do governo, marcada para o dia 7 de setembro.

O presidente não conseguiu apoio do Congresso para substituir a urna eletrônica pelo voto impresso, após travar embates com Luís Roberto Barroso, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ministro do STF.

Bolsonaro também apresentou pedido de impeachment do ministro da corte Alexandre de Moraes. A solicitação foi engavetada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

O governo ainda sofre reveses na Câmara para pôr em votação a reforma do Imposto de Renda, que sofre grande oposição de entidades empresariais e também de estados e municípios, mas é vista como uma peça eleitoral importante. Vai mudar a cobrança tributária da classe média, o que pode atrair votos na eleição.

A retirada dos bancos públicos, no entanto, é vista como uma manobra arriscada por gente fora do governo, especialmente no caso do BB. Como o banco tem capital aberto, o mercado tende a entender o movimento contra a Febraban como ingerência política do presidente da República.

Não seria a primeira vez, porém, que isso ocorreria. Em 2019, Rubem Novaes, à época à frente da instituição, atendeu Bolsonaro e demitiu o então diretor de marketing do banco, Delano Valentim, após a veiculação de uma campanha publicitária dirigida ao público jovem com mulheres e homens negros, e uma das personagens é transexual.

Em janeiro deste ano, o anúncio de uma reestruturação que previa fechamento de 361 unidades e programa de demissão voluntária no Banco do Brasil iniciou processo de fritura do então presidente, André Brandão, por Bolsonaro. A crise desembocou na indicação de Fausto Ribeiro, em março, para a presidência do órgão, após pedido de renúncia de Brandão. O administrador, que estava à frente do BB Consórcios, é considerado no Banco do Brasil um “bolsonarista” e, segundo funcionários da instituição, cobrou de sua equipe que trabalhasse de maneira presencial durante a pandemia.

Procurada, a assessoria de Skaf afirmou que não teria o que comentar. Banco do Brasil e Caixa Econômica não se pronunciaram.

Em nota, a Febraban disse que não comenta posições atribuídas a seus associados.

“Sobre o manifesto articulado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e dirigido a várias entidades, o assunto foi submetido à governança da Febraban”, afirmou.

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