Cultura

Das cinzas ao violão: bombeiro usou restos de madeira do Museu Nacional para construir instrumentos musicais

Documentário "Fênix: o voo de Davi" estreia este domingo na GloboNews e no próximo dia 2 no Globoplay
Gilberto Gil com Davi Lopes e violão feito com madeiras remanescentes do incêndio do Meseu Nacional Foto: Divulgação
Gilberto Gil com Davi Lopes e violão feito com madeiras remanescentes do incêndio do Meseu Nacional Foto: Divulgação

O incêndio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, que destruiu um acervo com mais de 20 milhões de itens, uma tragédia para a cultura e a ciência do país, completa três anos na próxima quinta-feira. Em meio aos escombros e à tristeza, o bombeiro e luthier Davi Lopes viu a possibilidade de fazer arte e dar novo sentido a sobras deixadas pelo fogo. Ele construiu instrumentos musicais com restos de madeira remanescentes do incêndio, uma história que virou o documentário “Fênix: o voo de Davi”, com produção original do GloboPlay em parceria com a GloboNews.

O canal vai exibir o filme neste domingo (29), às 23h, e a plataforma disponibilizará o título a partir do dia 2.

— Trazer o Museu Nacional de volta à pauta às vésperas de mais um aniversário do incêndio nos ajuda a cumprir um papel essencial do jornalismo: acompanhar os fatos, denunciar, cobrar decisões e políticas públicas — diz Fátima Baptista, chefe de redação da GloboNews e responsável pela supervisão do documentário, acrescentando outra função do filme. — E também alimentar a esperança, porque, se não é possível recuperar muitos itens, ainda é viável fazer o Museu reviver. Com tecnologia e vontade.

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A equipe começou a acompanhar Davi Lopes em setembro de 2018, e o filme mostra desde o processo de busca do material até a finalização dos instrumentos. A partir de pedaços de móveis e vigas queimadas foram confeccionados dois violões, um bandolim, um cavaquinho e um violino, que serão doados ao Museu Nacional. Enquanto a obra de reconstrução não termina, os instrumentos estão sob os cuidados de padrinhos como Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Nilze Carvalho, Felipe Prazeres, Paulinho Moska e Hamilton de Holanda — os dois últimos, inclusive, já se aprsentaram com seus “afilhados”.

— Eu me sinto honrado por fazer parte, de alguma forma, da reconstrução do Museu Nacional. Espero que a arte ajude a escrever um novo capítulo não só da minha vida, mas também do Museu, da nossa história — comenta o bombeiro e luthier.

O trabalho artesanal de construção dos instrumentos já fazia parte da vida de Lopes, que pode unir a paixão pela música com a profissão.

— Eu lembro de quando entrei pela primeira vez em um incêndio como bombeiro e vi que as madeiras que não tinham sido destruídas pelo fogo seriam descartadas. Sabia que uma viga, uma janela, um portal ou até parte de móveis que iriam para o lixo, poderiam ser aproveitadas ou reutilizadas. Isso porque sou um apaixonado pelas madeiras, seja como matéria prima para construir objetos úteis, ou por sua beleza, para as artes visuais. Eu também já era músico e um apaixonado pelo violão. Então, juntando as duas paixões, surgiu um luthier — explica.

No dia do incêndio, Davi Lopes estava de folga mas, quando soube o que estava acontecendo, decidiu se juntar à equipe. Vestiu o uniforme e foi ajudar a combater o incêndio. Frequentador do Museu Nacional quando criança, o bombeiro conta que o ocorrido mexeu muito com ele, que também levou suas filhas para conhecer o local.. Para ele poder tirar da tragédia algo novo foi um sentimento de vitória.

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Entre as cinzas, estavam peças de madeiras nobres como batentes de pinho-de-riga e vigas de braúna. egundo ele após a identificação e retirada das madeiras do local, a parte mais complicada é a limpeza da matéria-prima. Davi transformou partes de uma viga dos antigos aposentos de D. Pedro II em escalas de um violão e de um cavaquinho.

— Davi é um visionário, um brasileiro com B maiúsculo, que se preocupa com a cultura, o passado e o futuro do país, que arregaçou as mangas e enxergou nos escombros uma maneira de fazer a história renascer — elogia Fátima Baptista.

Ela conta que momentos da produção foram muito emocionantes: a descoberta dos tipos de madeira e o que ainda poderia ser feito delas; quando descobriram o som dos instrumentos construídos pelo Davi; os encontros com os padrinhos e as músicas que surgiram dali, além de cada visita ao Museu, foram alguns deles.