Teatro
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Por Nelson Gobbi


Gerald Thomas: adaptado ao teatro on-line Leo Martins — Foto:
Gerald Thomas: adaptado ao teatro on-line Leo Martins — Foto:

Dirigindo via Zoom de Nova York o monólogo “G.A.L.A.”, estrelado pela atriz Fabiana Gugli e que estreia hoje, às 21h, com transmissão pelo canal do Sesc Avenida Paulista, Gerald Thomas diz estar se adaptando ao teatro on-line, que havia criticado no início da pandemia. O diretor e autor fala também sobre a venda de obras suas para pagar uma dívida de aluguel, noticiada pela coluna de Ancelmo Gois, do livro que escreve sobre sua relação com a cocaína e de uma futura montagem de “Doroteia”, cujos direitos lhe foram negados na década de 1980, o que fez com que escrevesse sua primeira peça. “A negativa da família do Nelson Rodrigues me deu a habilidade de enfrentar o mundo como autor”, conta.

Em uma das cenas de 'G.A.L.A.', a personagem de Fabiana Gugli fala ao telefone com seu interlocutor: 'Agora é Talibã!'. A frase entrou após a saída das tropas americanas do Afeganistão?

Na peça, a Fabiana está falando com uma pessoa que está terminando o relacionamento. Tem um lado de ela querer aterrorizar a outra pessoa, e ela está vestida quase a rigor para terminar com alguém. O título faz referência a Gala, mulher de Salvador Dalí, e também a uma noite de gala. Tem um aspecto mais fútil neste sentido que é a forma de a garotada do Talibã se vestir, com aqueles turbantes incríveis, vários parecem o George Harrison. É como se estivessem a caráter no meio daquela barbárie toda.

Outra frase marcante do texto é 'Chega de Beckett'. A peça marca esse rompimento com o autor?

Beckett não permite que você construa, tudo é muito delimitado. Quando me peguei sendo “polícia de Beckett”, foi demais para mim. Uma vez, na década de 1980, fui ver uma montagem de “Fim de partida” do American Repertory Theater (em Cambridge, Massachusetts) a pedido dele, que era feita em uma estação de metrô e tinha um Hamm negro. Peguei um trem e fui lá dizer que o autor poderia criar problemas, coisa que odiaria se fizessem comigo. Deveria ter dito não, mas queria impressioná-lo. Fiquei um ano mal com isso. Fiz Beckett várias vezes depois, mas quando parei a vida voltou a ficar mais leve, o sorvete de creme voltou a ter gosto de sorvete de creme. Beckett te consome, você vive aquele paradigma.

Fabiana Gugli em cena de 'G.A.L.A.' Nicolas Caratori/Divulgação — Foto:
Fabiana Gugli em cena de 'G.A.L.A.' Nicolas Caratori/Divulgação — Foto:

Você chegou a criticar o teatro filmado ou transmitido, mas está estreando uma nova montagem on-line, que você dirige à distância. Sua opinião sobre o formato mudou?

Sabe que agora estou gostando mais? Tem uma coisa que é diferente, e pior, que é o tempo do ensaio. Presencialmente o elenco e a equipe chegam, se aclimatam, tomam um café e depois vão passar a cena. Agora não, você abre o Zoom e já começa: “Cena tal agora”. Minha cara fica ali aparecendo numa tela igual ao personagem do Ed Harris em “Show de Truman”. Mas também acho que é o que temos para agora, então vamos parar de reclamar! Todo mundo no teatro adora uma manha. “Ah, eu gostava de fazer para aquela cadeira e agora não posso”. Paciência, daqui a pouco vai poder. Nada é perfeito na vida, muito menos o teatro.

Há algumas semanas houve uma comoção com um vídeo seu falando que iria vender trabalhos artísticos para pagar uma dívida de aluguel. Como ficou a situação e como viu a repercussão? Recebeu ataques de haters?

Mandei o vídeo para um amigo e juro que a intenção não era que viralizasse. No dia a Fernandona (Fernanda Montenegro, ex-sogra de Gerald) me ligou e perguntou se estava tudo bem, porque eu estava em todos os lugares. Pensei: será que é a bunda do Municipal que voltou? (Em 2003, o diretor abaixou as calças na direção da plateia após a montagem de “Tristão e Isolda” no Theatro Municipal e chegou a ser processado por atentado ao pudor). Mas não cheguei a ser despejado como disseram, fiz um acordo com o serviço de proteção ao inquilino da cidade. Isso e a venda das obras vão permitir que fique um ano sem me preocupar. E agora os trabalhos estão voltando, a roda começa a girar novamente. Agora, muitos comentários foram aquilo, falando de Lei Rouanet, que nunca usei na vida, mas poderia ter usado. Isso mostra mais a pobreza da cabeça do pequeno fascista no Brasil do qualquer outra coisa.

Entre seus projetos paralelos, também está um livro sobre sua relação com a cocaína. Teve alguma dificuldade para parar de usar?

Nenhuma, foi igual ao cigarro. Parei porque era a mesma coisa sempre, já não aguentava mais. Mas nunca cheirei socialmente, ninguém jamais me viu em porta de banheiro, nem em festas. Nem vou a festas. Eu fazia uso em casa, chamava um grupo de 20 pessoas, e passávamos quatro dias trancados. No livro falo do lado econômico, da violência dos cartéis e da repressão, e um pouco da questão afrodisíaca da cocaína, que te desinibe.

Tem alguma recordação neste sentido?

Passei um ano sendo michê aqui, na adolescência, recebendo casais conservadores de Ohio que vinham a Nova York fazer as loucuras que não podiam lá. Eram aquelas caras meio Fellini e meio “O vampiro de Dusseldorf”. Eu cheirava para dar tesão, e de manhã, quando saía do hotel, o efeito também estava passando. Nessa época, fazia a mesma coisa todos os dias: esperava o MoMA abrir e me sentava à frente da “Guernica”, do Picasso (o painel deixou Nova York em 1981, quando foi enviado à Espanha). Me lembro de tudo, que ficava no terceiro andar, até do guarda que tomava conta da tela. Ficava olhando aquela lâmpada pintada por Picasso por horas e depois saía para começar um novo dia.

Você sempre foi creditado como 'brasileiro radicado em Nova York', mas encontrou em 2016 um registro de seu nascimento na cidade. Como se define?

Posso dizer que sou brasileiro, americano, mas também inglês, alemão, judeu... Toda essa salada está certa, não precisa em nenhum momento singularizar o "brasileiro". E eu realmente não tenho nenhum documento brasileiro, nem passaporte, gostaria até de ter para não enfrentar a fila dos estrangeiros quando vou ao país. Mas minha questão era mesmo com o termo "radicado" (risos). É daquelas coisas que desisti de brigar contra. Igual a ser chamado de "polêmico". Durante 30 anos fui chamado assim, mesmo que apresentasse um trabalho que não tivesse polêmica nenhuma.

Dia 3 de outubro, você estrela a performance 'The APOCALYPSE in a bottle: ART as WAR'. Como vai ser?

Vou sair remando no East River com um caiaque até o Brooklin, vai ter transmissão pelo YouTube mas quem quiser acompanhar é só pegar um caiaque e remar junto. O caiaque estará cheio de livros que considero os mais importantes, em vez de uma Arca de Noé será um pequeno caiaque que salva os melhores livros da humanidade. Do outro lado, pego uma página de livros como "O capital" (de Karl Marx) e "Guerra e paz" (de Liev Tolstói), coloco numa garrafa e solto no rio.

Você também está preparando sua primeira montagem de Nelson Rodrigues? Como sua obra daria conta da sociedade brasileira de hoje?

Quero montar “Doroteia” no ano que vem. Sempre tive o desejo de montá-la, pedi os direitos na época do “Quatro vezes Beckett” (em 1985), mas me foi negado pela família. Já estava até com elenco pronto. Aí decidi escrever “Electra com Creta” e foi a melhor coisa que me aconteceu. A negativa da família do Nelson me deu a habilidade de enfrentar o mundo com o autor. Mas acho que “Doroteia” tem menos a ver com o universo rodriguiano mais conhecido, assim como suas outras peças míticas. Elas são mais metalinguísticas, e o Brasil não é mais assim. O Brasil de hoje é totalmente direto e literal.

"G.A.L.A."

Onde: Transmissão pelo canal do Sesc Avenida Paulista(youtube.com/sescavenidapaulista). Após a apresentação, debate com diretor e a atriz Fabiana Gugli. Quando: Quarta-feira, às 21h (Após a apresentação, a peça fica disponível no canal do YouTube do Sesc). Quanto: Grátis. Duração: 45 minutos. Classificação: 16 anos.

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