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Em depoimento vago, Facebook tenta se defender sobre 'Instagram tóxico'

 Antigone Davis, executiva do Facebook em conferência virtual no senado americano sobre o Instagram - Reuters
Antigone Davis, executiva do Facebook em conferência virtual no senado americano sobre o Instagram Imagem: Reuters

Melissa Cruz Cossetti

Em colaboração para Tilt, do Rio de Janeiro

30/09/2021 17h40

Uma executiva do Facebook foi questionada nesta quinta-feira (30) por senadores no Congresso americano sobre o impacto dos aplicativos do grupo — especialmente o Instagram — em jovens.

A iniciativa ocorre duas semanas depois que um relatório divulgado pelo Wall Street Journal indicou que a empresa estava ciente de que o seu aplicativo de fotos poderia ter um efeito "tóxico" em meninas e jovens adolescentes.

A audiência contou com a presença da diretora global de segurança do Facebook, Antigone Davis, e é só a primeira de duas que o Comitê de Comércio do Senado marcou sobre a rede social.

Se neste primeiro momento, o Facebook focou em defender-se, na próxima semana, porém, o comitê deve receber o depoimento de um denunciante. Não se sabe, até o momento, quem é a pessoa aguardada pelo Senado.

Davis, que se identificou como mãe e ex-professora, rejeitou a ideia de que o relatório caiu como uma "bomba". Porém, não se comprometeu a divulgar um relatório da pesquisa completa, observando possíveis "considerações de privacidade". Ela disse que o Facebook está "procurando maneiras de lançar mais pesquisas", mas ainda manteve sigilo.

O Instagram disse que estava procurando novas maneiras de desencorajar as pessoas a se concentrarem na aparência física. A empresa também disse que, embora o Instagram possa ser um lugar onde as pessoas têm "experiências negativas", o aplicativo também dá voz às pessoas marginalizadas e ajuda amigos e familiares a se manterem conectados.

Pressão bipartidária

Se tem uma coisa capaz de unir ambos os partidos americanos, é o temor pelo efeito causado pelas big techs. Foram mais de três horas de pressão bipartidária.

"Agora sabemos que o Facebook rotineiramente coloca os lucros à frente da segurança online das crianças. Sabemos que escolhe o crescimento de seus produtos em vez do bem-estar de nossas crianças", disse o senador democrata Richard Blumenthal logo na abertura da audiência. "A questão que me assombra", acrescentou ele, "é como podemos nós [adultos], ou os pais, ou qualquer pessoa, confiar no Facebook?", indagou.

A senadora republicana Marsha Blackburn fez eco a Blumenthal em seus comentários. "Não confiamos em você [Facebook] para influenciar nossos filhos", disse.

Os legisladores exploraram longamente a pesquisa interna do Facebook vazada pelo The Wall Street Journal que revelou que a plataforma pode prejudicar a saúde mental e a imagem corporal de menores de idade, especialmente entre meninas adolescentes.

Eles também pressionaram a empresa sobre seus planos recentemente interrompidos para uma versão do aplicativo voltada para um grupo vulnerável: crianças menores de 13 anos.

"O Instagram é aquele cigarro da primeira infância, criado para fisgar os adolescentes cedo", disse o senador democrata Ed Markey. "O Facebook é como um gigante do tabaco, divulgando um produto que eles sabem que é prejudicial à saúde dos jovens", completou.

Blumenthal disse em seu discurso que pessoas do seu escritório criaram uma conta no Instagram identificando-se como uma menina de 13 anos. Seguiu perfis com relatos echeadas com outros relatos que promoviam automutilação e distúrbios alimentares variados.

Em defesa da plataforma, Davis pontuou que esse tipo de conteúdo viola os termos de uso e não é aceito na rede social — embora ainda seja encontrado, conforme relata o senador.

Discurso evasivo

As respostas vagas não caíram bem entre os ativistas dos direitos das crianças.

"Por 2,5 horas, a senhora Davis nos ofereceu evasivas e equívocos e se recusou a se comprometer com uma única mudança substantiva ou de ainda maior transparência", declarou Josh Golin, diretor executivo da Fairplay, um grupo de defesa dos direitos das criança, anteriormente conhecido como Campaign for a Commercial-Free Childhood, à CNN.

"Ela também continuou a divulgar a ficção de que o interesse do Facebook no Instagram Kids é impulsionado pela preocupação com a segurança das crianças, quando os próprios documentos que vazaram da empresa deixam claro que é parte de uma estratégia maior de crescimento e para competir com o TikTok e o Snapchat para usuários jovens", completou.

Davis, único nome do Facebook presente na audiência, disse que a empresa realiza tais pesquisas internas "para tornar as plataformas melhores" e que tomou medidas para torná-las mais seguras, como ferramentas para oferecer ajuda aos adolescentes se sua atividade sugerir que eles podem estar em risco de transtornos alimentares ou suicídio.

"No Facebook, levamos muito a sério a privacidade, a segurança e o bem-estar de todos aqueles que usam nossa plataforma, especialmente os mais jovens em nossos serviços", disse ela. "Trabalhamos incansavelmente para implementar as políticas, produtos e precauções corretas para que eles tenham uma experiência segura."

Davis disse ainda que o Facebook discorda "veementemente de como a reportagem [do WSJ] caracterizou nosso trabalho", acrescentando que "a pesquisa mostrou que muitos adolescentes dizem que o Instagram também está ajudando com problemas difíceis que são tão comuns na adolescência".

A executiva se recusou em dizer como e quando o Instagram para crianças deve ser desenvolvido e lançado. Ela também negou o compromisso de tornar públicas mais pesquisas internas do Facebook — mas disse que a empresa está considerando o caso.

O Facebook e outras grandes plataformas de tecnologia, conhecidas como big techs, enfrentaram o escrutínio do Congresso americano há mais de um ano sobre questões, incluindo abusos de privacidade tornados públicos por jornalistas, práticas de moderação de conteúdo questionáveis e preocupações com questões que envolvem concorrência desleal.

*Com informações de CNN e Wall Street Journal