Relator da CPI, Renan vai propor indiciamento de Bolsonaro, Queiroga, Braga Netto e Onyx

Como havia adiantado à Folha, senador do MDB sugere responsabilização do presidente por 11 crimes; filhos também serão alvo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

Relator da CPI da Covid, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) decidiu propor em seu texto final da comissão o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro e de outros três ministros de seu governo: o titular da Saúde, Marcelo Queiroga, o atual ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, e o atual ministro da Defesa, Walter Braga Netto.

Ele também definiu que irá propor a responsabilização de três filhos do presidente Jair Bolsonaro (o senador Flávio, o deputado Eduardo e o vereador Carlos) e do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR).

Como havia adiantado em entrevista à Folha, Renan vai sugerir o indiciamento de Bolsonaro por 11 crimes.

O relatório final vai propor indiciamento de Bolsonaro pelos crimes de epidemia, infração de medida sanitária preventiva, charlatanismo, incitação ao crime, falsificação de documento particular, emprego irregular de verbas públicas, prevaricação, genocídio de indígenas e crimes de responsabilidade (mais especificamente violação de direito social e incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo) e homicídio comissivo.

O documento prevê ainda o envio de denúncia de crime contra a humanidade ao Tribunal Penal Internacional.

O relatório final completo deve ser divulgado na próxima segunda-feira (18). A leitura do texto será feita em sessão da CPI da Covid no dia seguinte, com a votação pelos membros na quarta-feira (20).

Inicialmente, o relator não cogitava responsabilizar Bolsonaro por nenhuma tipificação relacionada a homicídio. No entanto, como afirmou na entrevista à reportagem, após reuniões com especialistas, decidiu responsabilizá-lo por homicídio comissivo, quando é cometido por omissão.

Crimes comissivos são aqueles em que há uma ação por parte daquele que pratica o crime, como é o caso do homicídio. No entanto, de acordo com o Código Penal, eles também podem se configurar por omissão, quando a pessoa que se omitiu “devia e podia agir para evitar o resultado”. Estão neste rol, por exemplo, aquele que tenha "por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância" ou que "de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado". ​

O relator da CPI vai propor o indiciamento do ministro Marcelo Queiroga pelo crime de epidemia culposa com resultado morte e prevaricação. Inicialmente respaldado pelos senadores ao substituir Eduardo Pazuello, os membros da comissão alegam que o atual ocupante da pasta se "converteu ao negacionismo".

Durante as sessões, citaram como exemplo a suspensão da vacinação de adolescentes e a própria defesa do chamado tratamento precoce em evento da Organização Mundial de Saúde.

Em relação ao ministro do Trabalho, o relator quer responsabilizar Onyx Lorenzoni por genocídio de indígenas, baseado em seus atos quando atuava no Palácio do Planalto.

O próprio relator, no entanto, reconhece que a denúncia pelo crime de genocídio enfrenta resistência de outros membros do grupo majoritário da comissão e por isso pode ser retirada do texto final.

Outro ponto polêmico se refere ao indiciamento de Braga Netto. Renan decidiu incluí-lo em sua prévia de relatório, argumentando que ele era o coordenador do comitê de enfrentamento da pandemia, ainda quando titular da Casa Civil. No entanto, reconhece que há resistência de senadores da comissão e pode retirar seu nome, se isso comprometer a maioria para aprovar o seu texto.

Renan também decidiu incluir em seu texto a proposta de indiciamento do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), por incitação ao crime.

Além disso, propõe acrescentar para Flávio a tipificação de advocacia administrativa. Isso porque o senador levou para uma reunião no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) o sócio-presidente da Precisa Medicamentos, Francisco Maximiano.

Como a coluna Painel da Folha mostrou, o relatório usa informações de 16 depoimentos prestados à Polícia Federal e encaminhados à comissão para indicar Carlos como articulador da rede bolsonarista de distribuição de notícias falsas e desinformação.

Com base nos relatos, a conclusão da apuração também deve apontar o deputado Eduardo Bolsonaro como elo da rede com supostos financiadores, entre eles os empresários Otávio Fakhoury e Luciano Hang.

Assim como também havia informado na entrevista à Folha, Renan incluiu em seu relatório o ex-ministro Eduardo Pazuello e o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco.

"Existem figuras principais [no relatório]. O general [Eduardo] Pazuello é um, o coronel Élcio Franco, o presidente da República, tiveram participações comprovadas na materialização do que aconteceu no Brasil e no custo que se pagou com vidas. Esses são os principais, mas vamos ter o indiciamento de mais de 40 pessoas", havia dito na entrevista.

O relatório propõe o indiciamento de Pazuello por sete crimes: epidemia, incitação ao crime, emprego irregular de verbas públicas, prevaricação, comunicação falsa de crime e genocídio indígena. O ex-ministro da Saúde também será alvo de denúncia apresentada ao Tribunal Penal Internacional, por crime contra a humanidade.

O documento de Renan Calheiros ainda vai propor o indiciamento do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros. O deputado foi apontado durante os trabalhos da comissão como envolvido em um "rolo" com a vacina indiana Covaxin. Um amigo próximo, Marcos Tolentino, foi apontado como sócio-oculto da empresa que ofereceu a garantia para a negociação envolvendo a imunização indiana.

Barros terá seu indiciamento proposto por advocacia administrativa, improbidade administrativa, incitação ao crime e formação de organização criminosa.

Também figuram na lista de investigados os deputados Osmar Terra (MDB-RS), Bia Kicis (PSL-DF), Carla Zambelli (PSL-SP) e a atual secretário de gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde Mayra Pinheiro, conhecida como "capitã cloroquina".

O senador Flávio Bolsonaro divulgou nota na qual afirma que o relatório da CPI "não se sustenta" e "é um desrespeito" com as vítimas da Covid-19 no Brasil. Diz ainda que o documento busca influir nas eleições presidenciais do próximo ano.

"Trata-se apenas de uma peça política para agradar ao PT e para tentar desgastar o presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2022. As acusações contra mim e contra o governo não têm base jurídica e sequer fazem sentido", afirma.

O parlamentar busca no texto ressaltar a compra e aplicação de vacinas pelo governo federal, a distribuição de oxigênio e o pagamento do auxílio emergencial.

ÚLTIMO DEPOIMENTO

Os senadores da CPI da Covid marcaram para a próxima segunda-feira (18) o depoimento de Nelson Mussolini, representante do Conselho Nacional de Saúde e também membro da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias ao Sistema Único de Saúde), órgão consultivo do Ministério da Saúde.

Os membros do grupo majoritário da CPI querem mais informações sobre a reunião da Conitec na última quarta-feira (7), quando seria avaliado o parece de um estudo contrário aos medicamentos do chamado "kit Covid". O assunto saiu de pauta, sem maiores justificativas.

"Quero saber até onde vai ou até onde foi a intervenção política nas decisões dessa instância técnica relativas aos protocolos de enfrentamento da pandemia", afirmou Randolfe Rodrigues.

Durante sessão da CPI naquele mesmo dia, os senadores apontaram ingerência do Palácio do Planalto na Conitec, por meio do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.

O tema teria sido retirado de pauta, alegam, a pedido do presidente Jair Bolsonaro, notório defensor da hidroxicloroquina e outros medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19.

Randolfe chegou a ler trecho do documento que seria discutido na Conitec.

"Sobre cloroquina e hidroxicloroquina, o que diz a Conitec e que deveria ser deliberado hoje neste relatório? 'Recomendamos não utilizar hidroxicloroquina, cloroquina, isolado ou em associação com azitromicina, em pacientes com suspeita ou diagnóstico de Covid-19, em tratamento ambulatorial. Recomendação forte. Certeza da evidência moderada ou ainda de não ter evidência'", leu o senador.

A decisão sobre o nome do depoente da próxima segunda-feira foi decidida em reunião virtual fechada dos membros da comissão.

Antes, em uma sessão oficial remota, os senadores aprovaram cinco requerimentos de convocação de membros da Conitec que haviam participado da reunião, mas decidiram afunilar em um único depoente durante o encontro reservado.

A ideia inicial dos senadores era ouvir na sessão de segunda-feira (18) o responsável pelo estudo, o médico Carlos Roberto Ribeiro de Carvalho.

No entanto, membros da comissão entraram em contato com o médico e foram informados que ele não estaria disposto a apresentar o estudo e as conclusões perante a CPI. Por isso, de maneira prática, decidiram aprovar a convocação de Carvalho e mais quatro membros da Conitec

Os senadores também aprovaram na sessão requerimento para a realização de uma audiência pública com familiares de vítimas da Covid-19.

Foram convidados a enfermeira de Manaus Mayra Pires Lima, Katia Shirlene Castilhos dos Santos, que perdeu familiares durante a pandemia; Rosane Brandão, que perdeu o companheiro; Jarquivaldo Bites Leite, que foi infectado pelo coronavírus; Antonio Carlos Costa, ONG Rio de paz; e Marco Antonio, também afetado pela pandemia.

O evento com familiares e membros da sociedade civil está marcado para a tarde de segunda-feira.

A decisão de ouvir um representante da Conitec na sessão com o último depoimento marcou uma mudança em relação ao planejamento inicial. Inicialmente, a sessão de segunda-feira (18) estava destinada para o terceiro depoimento do ministro da Saúde Marcelo Queiroga.

Os membros do grupo majoritário queriam ouvir novamente o titular da pasta, pois ele havia se recusado a responder um questionário enviado pela comissão.

Além disso, apontavam que ele havia se "se convertido ao negacionismo", ao interromper a vacinação contra a Covid-19 de adolescentes e por seu comportamento em Nova York, quando integrava comitiva presidencial, ao fazer gestos obscenos para manifestantes.

No dia seguinte, no entanto, Queiroga convocou uma entrevista coletiva para divulgar detalhes da vacinação contra a Covid-19 em 2022, satisfazendo uma demanda dos senadores.

Os últimos dias da CPI da Covid no Senado

Segunda (18)
Depoimento de Nelson Mussolini, representante do Conselho Nacional de Saúde e membro da Conitec
Audiência pública com familiares de vítimas da Covid-19
Relatório final da CPI deve ser divulgado

Terça (19)
O relator da CPI da Covid, senador Renan Calheiros (MDB-AL), faz a leitura do relatório final na comissão

Quarta (20)
Membros da comissão votam o relatório

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.