Por Clara Velasco, Felipe Grandin, Roney Domingos, Thiago Reis, g1

Rodrigo perdeu o pai, Luíz Carlos, para a Covid após ele se automedicar e ignorar a gravidade da doença. Marconi quase morreu após se negar a usar máscara e ter de ser levado de cadeira de rodas em estado crítico ao hospital. Adriana não conseguiu nem se despedir da mãe, Maria das Graças, que dizia que a doença era apenas uma “gripezinha” e que caixões estavam sendo enterrados sem ninguém dentro. Iomar só passou a levar a pandemia a sério depois de perder para a doença a mulher, os sogros e o irmão Anthony, enfermeiro que ficou famoso nas redes sociais por compartilhar mensagens antivacina.

Essas são apenas algumas das vítimas da desinformação em meio à pandemia da Covid-19, que já deixou mais de 600 mil mortos somente no Brasil. Uma pandemia agravada por uma enxurrada de informações falsas e enganosas disseminadas nas redes sociais.

Vítimas do negacionismo: as mortes causadas pela desinformação na pandemia da Covid-19

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Em um ano e meio, o Fato ou Fake, serviço de fact-checking do grupo Globo, publicou 565 checagens sobre a Covid-19. Tirou a limpo mensagens mentirosas e distorcidas contra máscaras, em defesa de receitas e medicamentos sem comprovação científica e contra as vacinas, entre outros temas recorrentes de negacionistas.

Mais do que confundir ou criar dúvida na população, essas mensagens falsas têm levado as pessoas a tomar atitudes que colocam a própria vida e a de outras pessoas em risco. Não usar máscara, se expor sem necessidade, não se vacinar, tomar remédios ineficazes…

Nos próximos dias, o g1 vai mostrar as histórias de Rodrigo, Adriana, Marconi e Iomar. Os dois primeiros lidam com o luto de um parente que preferiu acreditar em informações enganosas; o terceiro, afetado diretamente pelas mensagens falsas, hoje se diz arrependido de não ter confiado na ciência; e o quarto, que perdeu vários parentes para a doença, conta que só passou a levar a sério a pandemia após as tragédias familiares.

Fato ou Fake

Desde o início da pandemia, ondas de desinformação atingiram as mais variadas pessoas.

Primeiro, foram as curas “milagrosas”. Água quente, vitamina C e limão, ozonioterapia, chá de erva-doce e fígado de boi, água tônica, açafrão, chá de boldo, de casca de quina quina ou de artemísia, limão, laranja e mel, enxofre, sal e zinco, melão-de-são-caetano. Uma lista interminável tomou conta das redes sociais, mesmo sem nenhuma comprovação científica.

Depois, foram as mensagens falsas sobre as máscaras e o distanciamento social, apesar de vários estudos já comprovarem a eficácia tanto do equipamento de proteção como das medidas de isolamento.

Em algum momento, diversos boatos tentando minimizar os números da pandemia também circularam nas redes sociais. Comparações distorcidas, dados inventados... Não faltaram textos enganosos tentando negar o inegável.

A bola da vez são as vacinas. Há mensagens dizendo que elas ainda são experimentais, que podem gerar doenças autoimunes ou Alzheimer, que contêm óxido de grafeno, causando magnetismo, que alteram as células sanguíneas, enfim, que são ineficazes. A realidade, porém, é que os imunizantes têm tido papel fundamental para reduzir os casos e as mortes pelo novo coronavírus em todo o mundo.

Fato ou Fake: 565 checagens sobre o novo coronavírus — Foto: Rodrigo Sanches/G1

As 10 mais acessadas

Veja as 10 checagens mais clicadas ao longo da pandemia:

Fake news sobre o coronavírus: vacinas são a bola da vez — Foto: Joel Saget/AFP

‘Influencers de fake news’

A pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) Claudia Galhardi tem monitorado, desde março do ano passado, as fake news que mais têm circulado no país e diz que hoje, de fato, as vacinas são o grande alvo.

"No início, o que mais circulava eram métodos caseiros de cura, era algo de crença popular, não tinha conteúdo político. Era solução de bicarbonato com água morna, esse tipo de coisa", conta. "Logo foi tomando uma proporção mais pautada em uma ideologia política e em questões econômicas. Rechaçar o uso da máscara, distanciamento social, o lockdown."

Hoje, segundo ela, as mensagens são mais voltadas para criticar a vacina, apesar de ainda haver incentivo ao uso de medicamentos sem eficácia, o chamado "tratamento precoce".

G1 traz série de reportagens sobre vítimas do negacionismo

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"Temos conteúdo maior de tratamento precoce, já não citando cloroquina, ivermectina. Hoje se defende o termo, mas não se enfatiza a medicação. E (mensagens sobre) vacinas, as teorias conspiratórias sobre vacinas, dizendo que elas causam danos, não imunizam. Há vários tipos, sempre deslegitimando as vacinas."

A pesquisadora afirma que as mensagens não seguem um fluxo contínuo e aumentam ou diminuem de acordo com falas de influenciadores e personalidades de destaque.

"Todas essas falas acabam provocando ondas de fake news. São os grandes disseminadores, com seguidores nas redes sociais. Os atores que mais propagam, pelo menos dentro do que nós recebemos de denúncia, são ligados à política. A partir dessas publicações, outros conteúdos são criados", diz.

Estudos como esse da pesquisadora da Fiocruz têm proliferado no país e no mundo. São análises que comprovam o que pode ser visto na prática: fake news matam. E, na pandemia, têm ajudado a amplificar de forma aterradora um número já grande de vítimas da própria doença.

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