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Política CPI da Covid

Bolsonaro cometeu crimes sérios na pandemia, mas não genocídio, diz Omar Aziz em entrevista

Ao GLOBO, presidente do colegiado diz que não há 'prova factível' de advocacia administrativa de Flávio Bolsonaro
O presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM) 02/09/2021 Foto: Roque de Sá/Agência Senado
O presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM) 02/09/2021 Foto: Roque de Sá/Agência Senado

BRASÍLIA — O presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), afirmou nesta terça-feira que está comprovado que o presidente Jair Bolsonaro cometeu delitos sérios na pandemia, citando entre eles crime contra a humanidade e charlatanismo. Em entrevista ao GLOBO, Aziz ponderou que é preciso focar em acusações que possuem evidências consistentes para evitar questionamentos posteriores. Ele defende retirar do parecer final a acusação de genocídio contra indígenas por parte de Bolsonaro. No lugar, seria incluído um encaminhamento para aprofundar as investigações sobre o tema pelo Ministério Público após o encerramento da Comissão Parlamentar de Inquérito.

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Aziz também afirmou que é contra sugerir o indiciamento do filho do presidente da República, senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), pelo crime de advocacia administrativa, como consta na minuta do relatório de Renan Calheiros (MDB-AL), por avaliar que não há provas suficientes. Ele vai pedir, ainda, a retirada do nome do pastor Silas Malafaia entre os possíveis indiciados.

Leia mais: Omaz Aziz diz que relatório final deve excluir crimes de homicídio e genocídio contra Bolsonaro

Independente das alterações feitas por Renan, Aziz garante que votará favorável ao parecer e que o grupo majoritário G7 permanece unido. Confira os principais trechos da entrevista:

Após embates públicos entre o grupo G7, como está a relação entre os integrantes do grupo na reta final?

Temos que fazer o que é necessário para a gente conduzir e terminar os trabalhos. Nós vamos terminar. Quando a gente pega um peixe tucunaré, se você der linha, ele pula e solta na boca. Então você sempre tem que manter o tucunaré no cabresto. Esse governo está no cabresto. Não vamos dar folga para eles, não. Está fisgado. A gente não tem porque, depois de seis meses de trabalho, chegar agora no final e colocar tudo a perder. Isso não passa pela cabeça de ninguém.

Tem alguma possibilidade de meio termo sobre a questão do genocídio contra indígenas, um dos pontos de maior divergência no grupo, para garantir a aprovação?

Tem. Eu acho que temos que encaminhar para mais investigação (e não pedir indiciamento). É a minha opinião, não é para a gente esquecer, temos que ver isso. Temos que passar para todos os órgãos investigarem, o Ministério Público Federal do Amazonas, o Ministério Público Estadual do Amazonas, todos.

Essa questão do genocídio já está pacificada para constar no relatório dessa forma?

A grande preocupação em relação ao genocídio é que se você já tem crime contra a humanidade, já é um crime muito grande, e esse já foi provado e 'desprovado' por ele. O Bolsonaro fez aglomerações propositadamente, o Bolsonaro pregou a imunização de rebanho, pregou medicamento não comprovado, foi charlatão prescrevendo medicamento sem eficácia... Então, ele tem crimes sérios, só que o genocídio é muito mais sério que isso tudo. O meu medo é esse crime (genocídio) ser arquivado no futuro e os outros dizerem 'está vendo, eles estavam errados'. Mas, se o Renan mantiver esse ponto, eu votarei a favor.

É o único dos 12 crimes relacionados ao Bolsonaro que o senhor questiona?

Se você tem um caminho mais fácil para percorrer uma distância, por que ir no mais difícil? O mais difícil de tudo é essa questão (do genocídio). Genocídio é um planejamento proposital para extinguir uma etnia, como foi feito com judeus, como foi feito com turcos, na Bósnia, na Palestina. Houve planejamento de extinguir índios? Não. 'Ah, eles permitiram que o homem branco entrasse'. Espera aí, não permitiu. O índio não fica na maloca, ele sai. Índio não mora em maloca, ele mora em casa. Quando chegaram as vacinas (na Amazônia), para quem foi primeiro distribuído? Para os índios, a primeira e a segunda dose.

Então o senhor acha que não houve esse crime de genocídio?

Eu preciso ser convencido de que houve. Ate agora eu não fui.

Além disso, Renan incluiu homicídio qualificado. O senhor concorda?

Sim. Mas aí foi aglomeração, é outra coisa. Era proibido, ele foi multado. Ele fazia 'motociata', fazia questão de ficar sem máscara. Isso ele provocou, não foi espontâneo. Não é que ele desceu num local para ir ao banheiro e chegou um monte de gente na porta do banheiro, não. Era anunciado, se gastava dinheiro para fazer essa motociata, tudo era programado, então isso sim. Se é homicídio qualificado, não sei, mas é crime.

Leia : Relator da CPI sugere ao MPF que processe três empresas por improbidade administrativa

Há outros pontos considerados controversos, como o possível indiciamento de Flávio Bolsonaro por suposta advocacia administrativa. O que acha?

Eu não acho isso. Sinceramente, pessoalmente eu não vejo que o Flávio possui alguma prova factível de advocacia administrativa. O cara participar de uma reunião por vídeo para tratar do que eles falaram que estavam tratando ali. Eu não vejo mal nenhum nisso aí, todos os parlamentares fazem. Advocacia administrativa seria se ele dissesse 'eu quero que essa empresa ganhe porque não sei o quê", mas não é isso aí.
O senhor acha que existem excessos em alguns pontos do relatório?

Eu não vou comentar isso. Nem eu e nem ninguém no G7 vai falar.

A ideia é mostrar unidade do grupo?

Não há desunião, há divergências pontuais. Se teu marido discorda de você não quer dizer que você está desunindo dele. O que nós estamos discutindo são questões pequenas pelo trabalho que foi feito. Tem arranca rabo. Teve arranca rabo a CPI toda, ou vocês acham que foi todo mundo uma lua de mel? E eu sempre disse que se a CPI der certo foi o grupo todo, mas se der errado a responsabilidade é do presidente e do relator.
Vai fazer alguma sugestão de mudança para o Renan?

Ele sugeriu indiciamento do Silas Malafaia, mas é lógico que eu sou contra. Assim como o Malafaia tem quinhentos caras aí falando mal da gente. Sou contra indiciar o Malafaia. Vou votar contra.

Quais os grandes responsáveis pelos erros do governo na condução da pandemia?

Todos que o Renan está indiciando, cada um na sua área. Gabinete paralelo, gabinete de fake news, tem uma série de pessoas que têm participação direta.

O senhor acha que eles serão responsabilizados?

A população brasileira espera que se faça justiça, e a CPI está dando os caminhos.

Alguém do governo procurou o senhor sobre o relatório?

Não, ninguém. A única coisa que o líder (do governo no Senado) Fernando Bezerra me pediu e que eu cederei são 15 minutos para falar na leitura do relatório.

E tem mais algum acordo para a sessão de amanhã?

O que me preocupa é a condução para a leitura do relatório. Fazendo perguntas o pessoal pulava às vezes, imagina sendo acusado. Mas se precisar dou uma mãozada, não tem conversa nenhuma, não. Eu vi agora Marcos Rogério dizendo que soltou uma nota. Solta uma nota contra a CPI, não solta uma nota de solidariedade à população brasileira. É uma tristeza.

Qual foi o legado da CPI?

Eu acho que a democracia avançou muito na questão da informação. Nós proporcionamos já oito ações que estão por fora, na CGU (Controladoria-Geral da União), TCU (Tribunal de Contas da União). Sobre o caso Covaxin, Precisa, e tudo antes de a CPI acabar, mostrando que o governo nunca teve intenção de comprar vacinas. Se hoje tem 50% da população imunizada com duas doses, a CPI é uma das grandes responsáveis.

O senhor acha que o G7 pode continuar atuando junto depois da CPI?

Acho que nós criamos uma relação, apesar das divergências agora no final, muito próxima. Claro, podemos estar afastados porque temos diversos pensamentos. Mas o Randolfe (Rodrigues), por exemplo, é um grande amigo que eu criei. Vamos criar uma frente para continuar acompanhando (denúncias sobre a pandemia).