Abdel Fattah al-Burhan, general que chefiava o Conselho Soberano do Sudão, anuncia estado de emergência em todo o país e dissolve o próprio conselho, que supervisionava a transição de poder, e o governo de transição, que era comandado pelo primeiro-ministro que foi preso por militares — Foto: TV do Sudão via AP
Militares deram um golpe de Estado nesta segunda-feira (25) no Sudão, o terceiro maior país da África em extensão, e tomaram o poder após prender o primeiro-ministro interino, Abdallah Hamdok, ministros e outras autoridades civis.
O general Abdel Fattah al-Burhan, que chefiava o conselho que supervisionava a transição do país para uma democracia, fez um pronunciamento oficial na TV estatal, anunciou estado de emergência e dissolveu o próprio conselho e o governo de transição, que era comandado por Hamdok.
Antes mesmo do pronunciamento, milhares de pessoas saíram às ruas da capital Cartum e de Omdurman para protestar contra o golpe, bloquearam vias e incendiaram pneus, enquanto forças de segurança usaram gás lacrimogêneo para dispersá-las (veja no vídeo abaixo).
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Entenda abaixo o golpe militar em 5 pontos:
- Onde fica o Sudão
- O que era o governo de transição
- O que dizem os golpistas
- A reação da população
- A reação da comunidade internacional
Onde fica o Sudão
Terceiro maior país da África, o Sudão tem uma população similar à da Argentina e um dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do mundo.
O país fica entre a África Subsaariana e o Oriente Médio e faz fronteira com sete vizinhos (Egito, Líbia, Chade, República Centro-Africana, Sudão do Sul, Etiópia e Eritreia), além de ter saída para o Mar Vermelho (veja no mapa abaixo).
Ele só fica atrás da Argélia e da República Democrática do Congo em extensão territorial e tem cerca de 42 milhões de habitantes (a Argentina tem cerca de 45 milhões). Até a independência do Sudão do Sul, em 2011, o Sudão era o maior país do continente (e também do mundo árabe).
Sudão — Foto: g1
Sua capital é Cartum, onde os rios Nilo Branco e Nilo Azul se encontram e formam o rio Nilo, e a religião predominante do país é o Islã.
O Sudão tem um IDH de 0,510 e, em um ranking com 189 países, está empatado na 170ª posição com o do Haiti (o país mais pobre das Américas) e atrás do Afeganistão (169º).
O que era o governo de transição
O país era comandado por um governo interino desde 2019, quando o então ditador Omar al-Bashir foi deposto. Al-Bashir governou o país por três décadas, entre 1989 e 2019, e deixou o poder após protestos.
Quatro meses após a queda do ditador, foi criado um Conselho Soberano, que era formado por civis e militares, para supervisionar a transição do país para a democracia.
O governo interino era comandado por Abdallah Hamdok (foto abaixo), primeiro-ministro que foi preso nesta segunda, e o Conselho Soberano era chefiado pelo general Abdel Fattah al-Burhan, que fez um pronunciamento na TV estatal após o golpe de Estado.
O primeiro-ministro do Sudão, Abdalla Hamdok, em foto de 14 de fevereiro de 2020 em Berlim, na Alemanha — Foto: Hannibal Hanschke/Reuters
O local para onde Hamdok foi levado não foi informado, e ministros e membros civis do Conselho Soberano também foram detidos.
Civis e militares do conselho frequentemente discordavam discordavam sobre o futuro do país e o ritmo da transição para a democracia, e o governo interino já havia sofrido uma tentativa de golpe em 21 de setembro.
O general Burhan deveria entregar a liderança do Conselho Soberano a um civil nas próximas semanas, mas em vez disso:
- Prendeu Hamdok, ministros do governo interino e membros civis do Conselho Soberano;
- Decretou estado de emergência em todo o país;
- Dissolveu o Conselho Soberano e o governo interino.
O que dizem os golpistas
Horas após o golpe de Estado, Burhan fez um pronunciamento na TV estatal do país e anunciou o estado de emergência e a dissolução do conselho que chefiava e o governo de transição, comandado por Hamdok. Ele disse ainda que uma nova Constituição será escrita.
O general afirmou que disputas entre facções políticas levaram os militares a intervir e que os militares nomearão um governo para comandar o país até as eleições, marcadas para julho de 2023. Mas deixou claro que os militares permanecerão no comando:
“As Forças Armadas continuarão a completar a transição democrática até que a liderança do país seja entregue a um governo civil eleito”, afirmou Burhan.
Abdel Fattah al-Burhan, general que chefiava o Conselho Soberano do Sudão, anuncia estado de emergência em todo o país e dissolve o próprio conselho, que supervisionava a transição de poder, e o governo de transição, que era comandado pelo primeiro-ministro que foi preso por militares — Foto: TV do Sudão via AP
A reação da população
A Associação de Profissionais do Sudão (SPA), principal grupo responsável pelos protestos que resultaram na queda do ditador Omar al-Bashir, convocou a população para uma greve geral e pediu desobediência civil contra o golpe militar.
"Convocamos as massas para que saiam às ruas e as ocupem, fechem todas as estradas com barricadas, façam uma greve geral, não cooperem com os golpistas e usem a desobediência civil para enfrentá-los”, disse o grupo em um comunicado.
Ainda antes do pronunciamento de Burhan, milhares saíram às ruas de Cartum e de Omdurman para protestar, enquanto forças de segurança usaram gás lacrimogêneo para dispersá-los.
A TV Al-Arabiya diz que várias pessoas ficaram feridas após manifestantes e soldados entrarem em confronto perto de quartéis na capital. Um comitê de médicos local afirma que ao menos 12 pessoas ficaram feridas em confrontos.
Manifestantes ateiam fogo a pneus em rua de Cartum, capital do Sudão
A reação internacional
O presidente da União Africana pediu em um comunicado que líderes políticos do Sudão sejam soltos. A ONU, os Estados Unidos e a União Europeia expressaram preocupação com os acontecimentos desta segunda.
Jeffrey Feltman, o enviado especial dos EUA para a região, disse que o país está "profundamente alarmado" com a notícia. O americano havia se reunido com autoridades sudanesas no fim de semana para tentar resolver a crescente disputa política entre líderes civis e militares.
A porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, afirmou que o governo dos EUA "rejeita as ações dos militares e pede a libertação imediata do primeiro-ministro e de outros que foram colocados em prisão domiciliar".
O chefe de relações exteriores da União Europeia, Joseph Borrell, afirmou que está acompanhando os eventos no Sudão com "a maior preocupação". Volker Perthes, representante da ONU, afirmou que a entidade está "profundamente preocupada com relatos de um golpe em curso no Sudão".