Ciência

Mais de 80% dos brasileiros e de 95% das empresas jogam comida fora, mostra estudo

Embora a maioria da população diga que se preocupa com o desperdício, na prática o país é um dos que mais descarta alimentos no mundo

Metade dos alimentos vai para o lixo durante o transporte das lavouras até as cidades (Andrea Pistolesi/Getty Images)

Metade dos alimentos vai para o lixo durante o transporte das lavouras até as cidades (Andrea Pistolesi/Getty Images)

EXAME Solutions
EXAME Solutions

EXAME Solutions

Publicado em 27 de julho de 2023 às 08h03.

Última atualização em 17 de outubro de 2023 às 13h06.

O Brasil está entre os dez países que mais desperdiçam comida no mundo: anualmente, 27 milhões de toneladas de alimentos vão parar no lixo, segundo a ONU. Cada brasileiro joga fora todo ano, em média, 60 quilos de alimentos ainda em boas condições para consumo. Nos supermercados, apenas em frutas, legumes e verduras, o país perde anualmente R$ 1,3 bilhão, conforme levantamento da ABRAS.

Enquanto isso, dados da Rede Penssan contabilizam 33 milhões de brasileiros passando fome ou insegurança alimentar, o correspondente a mais de 15% da população, o que agrava a situação.

Apesar dos números alarmantes, há um paradoxo: 85% dos brasileiros acham que combater o desperdício de alimentos no país é muito importante e 63% consideram a fome no mundo e no Brasil o desafio atual mais preocupante. 

Os dados são do estudo O Alimento que Jogamos Fora, realizado pela MindMiners, empresa de pesquisa digital, em parceria com a Nestlé, que ouviu a população em geral e também donos e funcionários de estabelecimentos do setor alimentício.

O objetivo foi desenhar um panorama do desperdício alimentar no Brasil, medindo o impacto e a consciência sobre o problema e o quanto pessoas e empresas estão preocupadas e engajadas com o assunto. 

Por que desperdiçamos tanto?

Se somos tão conscientes sobre a questão, em teoria, por que então ainda descartamos tanta comida? “A conta não fecha”, diz o relatório. 

A resposta talvez passe pela falta de informação sobre como reduzir de fato o desperdício. Porque quando avaliam a si mesmos, 64% dos indivíduos acham que estão fazendo a sua parte no combate ao problema e, entre os entrevistados de estabelecimentos comerciais, 66% também creem cumprir o seu papel. 

Quem mais tem consciência são o público feminino, os mais velhos (especialmente os boomers, geração acima de 59 anos) e as pessoas com filhos. Isso indica que existe uma parcela da população mais sensível ao tema, sendo, portanto, peça-chave para uma mudança efetiva de comportamento.

Onde mais se desperdiça?

Outro apontamento do estudo que ajuda a entender o cenário é onde o desperdício se concentra . Ao contrário do que se pensa, a maior fatia está antes de o alimento chegar à mesa do consumidor final: 50% acontecem durante o manuseio e transporte, 30% nas centrais de abastecimento, 10% no campo e outros 10% no varejo e nas residências.

No entanto, 75% das pessoas acreditam que o maior causador do desperdício de alimentos é a população. Para quem é dono ou funcionário de uma empresa do setor de alimentos, a percepção equivocada é a mesma: 66% colocam a população como a grande responsável.

Como se comportam indivíduos e empresas até agora?

A maioria dos brasileiros prepara suas refeições em casa, de acordo com o levantamento – 37% comem mais na residência do que fora e 35% apenas em casa. Somente 3% usam serviços de delivery com frequência, enquanto que 63% o fazem raramente ou nunca. 

Esse perfil pode minimizar o desperdício porque permite que as refeições sejam planejadas, controlando porções e ingredientes, e as sobras sejam melhor aproveitadas, em outra refeição ou no preparo de uma nova receita. Mesmo assim, 82% das pessoas dizem que jogam alimentos fora em alguma medida. 

Dentro de casa, a comida preparada é a que mais vai para o lixo, apesar de a maioria relatar que se planeja para comprar e preparar apenas o que será consumido na refeição ou naquele dia. Quando há sobras de comida, 59% guardam na geladeira para comer depois, 29% congelam e 25% fazem outra receita.

A classe C se sobressai na questão do planejamento, o que pode ter mais relação com a limitação financeira do que a conscientização sobre o desperdício. Por outro lado, a classe A é a que descarta alimentos com maior frequência. 

Em relação às empresas, 96% afirmam descartar alimentos, e com bem mais constância: 54% o fazem frequentemente e sempre. As principais causas são as sobras de alimentos deixadas pelos clientes (49%) e produtos vencidos (36%).

O que fazemos com produtos fora da validade?

Sobre os produtos com prazo de validade vencido, mas que aparentam estar bons, 64% das pessoas estão dispostas a consumir esses alimentos dependendo da situação. 

Sete em cada dez respondentes se mostram atentos à data de validade, especialmente mulheres e quem tem filhos, e metade dos entrevistados diz fazer compras pelo menos uma vez por semana, o que permite comprar produtos próximos do vencimento, que têm preço mais baixo. 

Já nas empresas, o cenário é diferente, já que não podem ser tão flexíveis quanto à validade. Além disso, utilizam mais critérios para o descarte, enquanto que a população é menos criteriosa, jogando fora apenas quando o produto está claramente estragado. 

Como são descartados os alimentos?

Nas residências, metade dos respondentes descartam os alimentos no lixo comum, quando isso deveria ser feito em lixo orgânico (destinado a restos de comida, cascas de frutas e afins). Nas empresas, o índice desse comportamento é bem menor, de 22%. Mais da metade, 55%, faz o descarte adequado.  

E quem come fora de casa?

No caso de quem faz as refeições fora, 41% costumam ir a restaurantes e 26% levam a marmita feita em casa. Também em restaurantes, não desperdiçar é uma preocupação: só 20% não se incomodam em deixar sobras no prato, apesar de essa ser uma situação que acontece às vezes com a maioria. 

Um quarto dos entrevistados até deixa de pedir um prato se a quantidade de comida é maior do que o necessário. 

Oito em cada dez dizem sentir raiva ou tristeza quando descartam alimentos ou presenciam alguém fazendo isso. Entre os empresários e colaboradores, a porcentagem também é alta, de 68%. 

O que mais podemos fazer? 

Além de planejar bem o cardápio e as compras para levar apenas o necessário, atentar-se ao prazo de validade dos alimentos e armazená-los corretamente para prolongar sua vida útil, é possível incorporar outras ações na rotina. Alguns exemplos:

  • Comprar itens de produção local, que são mais frescos (duram mais, portanto) e têm tempo de transporte menor, evitando perdas no caminho. Hoje, menos de 40% têm esse hábito. 
  • Priorizar alimentos da estação, que têm maior qualidade e durabilidade. Mais de 60% dos brasileiros não se atentam à sazonalidade dos alimentos.
  • Preferir produtos a granel, que vêm na quantidade necessária. Quase metade da população não utiliza essa opção. 
  • Reaproveitar cascas e talos para novas receitas. Cerca de 60% jogam fora essas partes, muito nutritivas. 
  • Doar alimentos não usados para bancos de alimentos ou pessoas que precisam. Só 13% fazem isso sempre.
  • Compartilhar informação sobre como evitar o desperdício. 
Acompanhe tudo sobre:NetZeroAlimentaçãoAlimentando o Planeta

Mais de Ciência

Usuários do Wegovy mantêm perda de peso por quatro anos, diz Novo Nordisk

Meteoros de rastros do Halley podem ser vistos na madrugada de domingo

AstraZeneca admite efeito colateral raro da vacina contra covid-19

Aranhas em marte? Fenômeno cria 'aracnídeos' no planeta vermelho

Mais na Exame